Ano-Novo é uma convenção. Os dias correm
em sequência. De 31 de dezembro para 1º de janeiro ocorrerá apenas mais uma
sucessão de 24 horas em que nada mudará, tudo seguirá do mesmo jeito. Pois é,
sei disso, mas é um ponto de vista sem nenhuma alegria. Sou das que compram o pacote
de Ano-Novo com tudo que ele traz em seu imaginário: balanço de vida,
reafirmação de votos, desejos manifestos e esperança de uma etapa promissora
pela frente.
Faço lista de projetos e tudo mais. Só
que, quando chega o fim do ano e avalio o que consegui cumprir, descubro que o
inesperado superou de longe o esperado. As melhores coisas do ano sempre foram
aquelas que eu não previ. Então tomei uma decisão: nessa virada, não vou
planejar coisa alguma e aguardar as resoluções que novo ano tomará para mim, à
minha revelia.
Mas poderia dar algumas
sugestões?
Ano Novo, anote aí: que as coisas mudem,
mas não alterem meu estado de espírito. Não deixe que eu me torne uma pessoa
ranzinza, mal-humorada, desconfiada, sem tolerância para as diferenças. Aconteça
o que acontecer, que eu me mantenha aberta, leve e consciente de que tudo é
provisório.
Não quero mais. Quero menos. Menos
preocupações, menos culpa, menos racionalismo. Pode cortar os extras. Mantenha
apenas o estritamente necessário para me manter atenta.
Está anotando?
Espero que você esteja com ótimos planos
para sua amiga aqui. Lançarei livro novo? Permita que eu seja abusada: dois.
Sendo que nenhuma coletânea de crônicas, nem romance. Me ajude a
variar.
Que lugares conhecerei que ainda não
conheço? Que pessoas entrarão na minha vida que, quando cruzo com elas na rua,
ainda não as identifico? Que boas notícias ouvirei das minhas filhas? Quantos
shows terei o prazer de assistir? Estou curiosa para saber o que você está
aprontando para incrementar os meses que virão.
Prometo que estarei preparada para
receber o abraço afetuoso de quem antes me esnobava, para a frustração por tudo
o que for cancelado, para voltar atrás nas minhas teimosias, para me dedicar a
algo que nunca fiz antes.
Estarei disposta a tirar de letra os
espíritos de porco e assumir a responsabilidade pelas asneiras que eu mesma
cometer. E estarei pronta também para uma grande surpresa, ou até duas. Três,
meu coração não aguenta.
Se
a dor me alcançar, que me encontre com energia e sabedoria para enfrentá-la. Que
eu não me torne dura diante dos horrores, nem sentimentaloide diante das
emoções. Ano Novo, os acontecimentos são da sua alçada. Da minha, cabe
recepcioná-los com categoria.
Quais são seus planos para mim, afinal?
Talvez nem todos sejam do meu agrado, portanto, que eu não tenha constrangimento
em dizer “não, obrigada”, caso seja preciso. Mas que eu me sinta mais
predisposta para o sim.
Se
estamos de acordo, pode vir.
(Martha Medeiros)
Adoro a Martha!
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